A redução do consumo de produtos de origem animal é um dos passos mais decisivos na adoção de uma dieta mais sustentável.
Impacto ambiental
O setor pecuário compete cada vez mais por recursos naturais escassos, como a água, o solo e energia. Tem um forte impacto na qualidade do ar, da água e do solo, devido a fatores como as emissões de gases com efeito de estufa (GEE) - sendo um dos principais contribuidores - e a erosão dos solos. Tudo isto acaba também por afetar a biodiversidade. [1,2]
De entre os vários produtos alimentares de origem animal, destaca-se a carne (em especial, de vaca, seguida da de porco), como um dos géneros alimentícios com maior pegada ecológica, exigindo um maior gasto de água e ocupação de solo, e originando uma maior produção de GEE. [2]
-
Esta grande produção de GEE deve-se a um processo de fermentação entérica que ocorre nos ruminantes. Este processo dá origem a um gás, denominado metano, que apresenta um potencial de efeito de estufa doze vezes superior ao do dióxido de carbono (CO2). [3]
O gasto de água considerado para a criação de gado é referente a: [2]
- 98% para o cultivo de ração animal;
- 2% para água ingerida pelos animais e utilizada para outras necessidades na produção.
A pecuária é também responsável por impulsionar a desflorestação, dado que é necessário bastante terreno para a pastagem e cultivo de rações. Esta desflorestação irá inevitavelmente diminuir a capacidade de reabsorção de CO2 da atmosfera. [1]
Tendência de consumo atual
Ainda assim, ao longo dos últimos 50 anos, é notório um aumento do consumo de proteína de origem animal. [3] O consumo médio global per capita de carne tem vindo a aumentar, impulsionado pelo aumento da população mundial, bem como pelo aumento do consumo deste tipo de produtos em países como a China. Verifica-se, de facto, um aumento global, ainda que em países com maiores rendimentos este consumo tenha estabilizado ou reduzido. [2]
Figura 1 - Consumo total de carne em diferentes regiões do mundo. [4]
Um estudo da FAO projeta que, até meio do século, ocorrerá um aumento de 76% do consumo total de carne. [5]
Impacto a nível da saúde
Os produtos de origem animal podem ter um papel importante na alimentação. A carne, especificamente, é uma boa fonte de energia, proteína e micronutrientes, como o ferro, zinco e vitamina B12. É, no entanto, possível atingir uma ingestão adequada destes nutrientes, mesmo não consumindo carne, substituindo-a por uma variedade de outros alimentos e realizando uma alimentação adequada. [6]
Todavia, isto poderá não ser possível em países de baixos rendimentos, em que o acesso a alimentos nutricionalmente ricos poderá ser limitado. [2]
Em contrapartida, vários estudos têm vindo a demonstrar que uma elevada ingestão de carne, especificamente carne vermelha e processada, se encontra associada a uma maior taxa de mortalidade. [7]
Efetivamente, a IARC – Agência para a Investigação do Cancro da Organização Mundial da Saúde – classifica as carnes processadas como carcinogénicas e as carnes vermelhas como provavelmente carcinogénicas, existindo uma associação com o risco de desenvolvimento de cancro colorretal. [8]
Redução do Consumo de Carne
Tendo em conta a informação apresentada, a redução do consumo de produtos de origem animal, em especial de carne (sendo um dos alimentos com maior impacto ambiental), poderá ser uma alternativa vantajosa tanto para a redução da pegada ecológica como para a saúde, desde que executada de maneira correta.
Na prática, isto passará por vários aspetos:
-
- Inclusão de algumas refeições com proteína de base vegetal, incluindo nas mesmas alimentos como as leguminosas (feijão, grão, lentilhas…) ou alternativas como o tofu e o seitan;
- Quando consumir carne, não ultrapassar as 100g/dia;
- Consumindo produtos de origem animal, podemos optar por aqueles com menor pegada ecológica, sendo que de maior para menor impacto temos: [1]
Segundo dados do 2º Grande Inquérito sobre Sustentabilidade em Portugal, 50,6% dos inquiridos demonstraram-se recetivos à redução do consumo de carne, ainda que, atualmente, a mesma ainda ocupe um papel central nas refeições dos portugueses. [9]
De facto, é evidente a crescente preocupação com este assunto, tendo vindo a surgir várias iniciativas no sentido da redução do consumo de carne como é o caso das Segundas sem Carne, do setembro sem Carne e do Desafio Vegetariano.
O consumo de proteína vegetal é ecologicamente mais favorável, sendo mais eficiente o consumo destes alimentos diretamente pelos humanos, do que o consumo dos mesmos por animais que serão depois consumidos pelo Homem.
Uma desvantagem da proteína vegetal é, no entanto, o perfil incompleto em aminoácidos essenciais. Contudo, este fator é facilmente ultrapassado pela conjugação com outros alimentos como os cereais (ex: feijão + arroz), mantendo uma dieta variada. [3]
Em futuros artigos, aprofundaremos alternativas como as leguminosas, abordando também mais detalhadamente questões como os aminoácidos essenciais.
Fontes:
[1] - Vries M, Boer IJM. Comparing environmental impacts for livestock products: A review of life cycle assessments. Vol. 128, Livestock Science. Elsevier; 2010.
[2] - Godfray HCJ, Aveyard P, Garnett T, Hall JW, Key TJ, Lorimer J, et al. Meat consumption, health, and the environment . American Association for the Advancement of Science; 2018
[3] - Morawicki RO, Díaz González DJ. Food Sustainability in the Context of Human Behavior. Vol. 91, YALE JOURNAL OF BIOLOGY AND MEDICINE. 2018.
[4] - FAOSTAT [Internet]. Fao.org. 2021 [cited 12 January 2021]. Available from: http://www.fao.org/faostat/en/?#data
[5] - World agriculture: towards 2030/2050 – The 2012 revision | Global Perspectives Studies | Food and Agriculture Organization of the United Nations
[6] - Appleby PN, Crowe FL, Bradbury KE, Travis RC, Key TJ. Mortality in vegetarians and comparable nonvegetarians in the United Kingdom. Am J Clin Nutr [Internet]. 2016
[7] - Wang X, Lin X, Ouyang YY, Liu J, Zhao G, Pan A, et al. Red and processed meat consumption and mortality: Dose-response meta-analysis of prospective cohort studies [Internet]. Vol. 19, Public Health Nutrition. Cambridge University Press; 2016
[8] - V. Bouvardet et al., Carcinogenicity of consumption of red andprocessed meat. Lancet Oncol.16, 1599–1600 (2015)
[9] - Truninger M, Schmidt L, Fonseca S, Prista P. Segundo Grande Inquérito sobre Sustentabilidade. 2019.