O glúten é atualmente um tema com bastante popularidade. Um dos géneros alimentícios que surgem muito associados são as farinhas. Assim sendo, o tema do artigo de hoje é o glúten e farinhas.

Na história da alimentação, há uma década, associavam-se a hábitos saudáveis cortar gorduras saturadas (“más”) e açúcar da alimentação. Contudo, atualmente, o glúten tem vindo a ser encarado também como um inimigo da alimentação saudável. [1]

De facto, de acordo com uma empresa de informações americana, em 2013, nos Estados Unidos, um terço dos adultos, sem necessidades de saúde, desejava começar a cortar o glúten da sua alimentação. [1]

 

Glúten e Farinhas

 

O que é o glúten?

O glúten trata-se de um conjunto de proteínas de origem vegetal insolúveis, principalmente a gliadina e glutenina (coletivamente referidas como prolaminas). [2]

Encontram-se presentes no endosperma de cereais como o trigo, centeio e cevada. Algumas proteínas associadas ao glúten podem também ser encontradas no malte, triticale, espelta e kamut. [2,3]

O glúten é responsável pela elasticidade da massa e pela consistência esponjosa e fofa dos pães e bolos. Devido às suas propriedades organoléticas, é um dos ingredientes mais utilizados na indústria alimentar, o que faz com que esteja presente em muitos produtos processados. [4]

 

O glúten faz mal?

Não. Para a população em geral - sem distúrbios associadas ao glúten - não existe evidência de que a prática de uma dieta isenta de glúten seja mais benéfica para a saúde ou que promova a perda de peso. 

Ainda assim, há uma tendência crescente na população em geral, sem distúrbios associados ao glúten, para consumir produtos sem glúten ou aderir a uma dieta "gluten-free". Estudos recentes demonstram que a adesão a este tipo de dieta na população adulta chega a 7% em alguns países, havendo a perceção de que esta seja uma escolha saudável como motivação. [3,5]

 

Intolerância, Alergia e Doença Celíaca [3]

As doenças associadas ao glúten são definidas como reações adversas ao glúten mediadas pelo sistema imunológico. A doença celíaca e a alergia ao trigo são duas doenças inseridas neste grupo.

A doença celíaca é uma doença crónica, autoimune, que surge na sequência da ingestão de glúten em indivíduos geneticamente suscetíveis e que conduz a danos no intestino (prevalente em cerca de 0,5% –1% na população em geral). 

Por outro lado, a alergia ao glúten e/ou outras proteínas do trigo trata-se de um distúrbio mediado por anticorpos, desencadeando uma cascata que deriva da inflamação alérgica  (prevalente em 0,33% a 1,17% da população).

Um terceiro distúrbio associado ao consumo de glúten é a sensibilidade não celíaca ao glúten, uma condição recentemente descrita na qual ocorre sintomatologia após o consumo de glúten e/ou outros componentes dos cereais (prevalência entre 0,16% e 13% da população). Verifica-se melhoria dos sintomas praticando uma dieta sem glúten ou reduzindo a ingestão do mesmo. 

Sintomas associados à sensibilidade ao glúten e doença celíaca: diarreia, dor abdominal, sensação de inchaço e enfartamento, flatulência, dermatite...

 

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Dieta isenta de glúten

Atualmente, a gestão das doenças associadas ao glúten passa pela evicção (perda total) do mesmo da alimentação, considerando que o nível de restrição será dependente do nível de sensibilidade. [6]

Desta forma, um doente celíaco terá que ter cuidados que não serão necessários para uma pessoa que tenha apenas sensibilidade ao glúten. Nomeadamente, os doentes celíacos não devem comprar produtos a granel uma vez que existe a probabilidade de ocorrência de contaminação cruzada (quando dois alimentos diferentes entram em contacto e o alimento “seguro” passa a conter uma pequena quantidade do alimento alergénico), o que poderá ser suficiente para desencadear reações adversas. [7]

 

Farinhas, uma substituição não tão óbvia

Um dos produtos alimetares associados ao glúten são as farinhas e os alimentos em que são integradas, nomeadamente, o pão. Dada a grande oferta e diversidade de farinhas existente atualmente, a sua escolha pode, por vezes, ser um fator de confusão.

As farinhas com glúten serão então as dos cereais trigo, centeio, cevada, malte, triticale, espelta e kamut. No entanto, no caso de celíacos, mesmo não sendo uma farinha (ou outro tipo de produto) à partida com glúten, a verificação da presença do símbolo internacional em produtos sem glúten facilita a identificação/confirmação de que o mesmo é apto para celíacos.[8] Isto é especialmente útil em casos como a aveia, em que deve mesmo haver a menção de que é isenta de glúten.

 

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A fabrico de produtos sem glúten é desafiante, pois este contribui com propriedades estruturais, reológicas e organolépticas características. Atualmente, não há nenhum substituto direto para o glúten, recorrendo-se a uma combinação de farinhas de cereais sem glúten (por exemplo, milho e arroz), hidrocolóides e proteínas ​​para fazer produtos sem glúten - procurando mimicar as propriedades do mesmo. [9]

Na prática:

Se pretendermos fazer, por exemplo, um pão sem glúten e, assumindo que queremos manter características semelhantes às do pão como o conhecemos, não devemos simplesmente substituir uma farinha por outra mas sim fazer uma combinação de várias e possivelmente outros ingredientes que permitam esta aproximação. Ex: farinha de aveia, farinha de arroz, fécula de batata e psyllium husk (contém fibra solúvel).

 

 

 

 

Fontes:

1 - Percentage of U.S. Adults Trying to Cut Down or Avoid Gluten [Internet]. [cited 2021 Mar 15]. Available from: https://www.npd.com/wps/portal/npd/us/news/press-releases/percentage-of-us-adults-trying-to-cut-down-or-avoid-gluten-in-their-diets-reaches-new-high-in-2013-reports-npd/ 

2 - Biesiekierski JR. What is gluten? J Gastroenterol Hepatol [Internet]. 2017 Mar 1 [cited 2021 Mar 15];32:78–81. Available from: http://doi.wiley.com/10.1111/jgh.13703

3 - Cabanillas B. Gluten-related disorders: Celiac disease, wheat allergy, and nonceliac gluten sensitivity [Internet]. Vol. 60, Critical Reviews in Food Science and Nutrition. Taylor and Francis Inc.; 2020 [cited 2021 Mar 15]. p. 2606–21. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/31402697/

4 - Parker, R., 2003. Introduction to food science. [cited 2021 Mar 15] Available from: https://books.google.pt/books/about/IntroductiontoFoodScience.html?id=kouqQnLl7V4C&rediresc=y

5 - Ditch the Gluten, Improve Your Health? - Harvard Health [Internet]. [cited 2021 Mar 15]. Available from: https://www.health.harvard.edu/staying-healthy/ditch-the-gluten-improve-your-health

6 - Bascuñán KA, Vespa MC, Araya M. Celiac disease: understanding the gluten-free diet [Internet]. Vol. 56, European Journal of Nutrition. Dr. Dietrich Steinkopff Verlag GmbH and Co. KG; 2017 [cited 2021 Mar 15]. p. 449–59. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/27334430/

7 - Contaminação cruzada - APC [Internet]. [cited 2021 Mar 15]. Available from: https://www.celiacos.org.pt/contaminacao-cruzada/

8 - Como obter o símbolo internacional - ELS - APC [Internet]. [cited 2021 Mar 15]. Available from: https://www.celiacos.org.pt/como-obter-o-simbolo-internacional-ELS/

9 -  Allen B, Orfila C. The Availability and Nutritional Adequacy of Gluten-Free Bread and Pasta. [cited 2021 Mar 15]; Available from: www.mdpi.com/journal/nutrients