Na semana anterior à Fashion Revolution Week, tema abordado num artigo anterior , abordamos agora, na área da alimentação, os passos que têm sido dados no sentido da revolução para a sustentabilidade alimentar, contemplando a situação atual em especial a nível nacional.
Sabemos que o sistema alimentar global atual não é sustentável, sendo responsável por uma quantidade significativa das emissões de gases com efeito de estufa, ocupando cerca de 40% do solo disponível e levando ainda a um grande gasto dos recursos hídricos. [1]
Adicionalmente, temos a realidade do desperdício alimentar, sendo que, com a população mundial em crescimento e, com uma parte da mesma em situação de insegurança alimentar, paradoxalmente, são desperdiçados cerca de 1/3 dos alimentos produzidos. [2]
Uma mudança de perspetiva
Com o aumento da sensibilização para estas questões, aumenta também a preocupação com a adoção de escolhas mais sustentáveis. De facto, segundo a PortugalFoods, a sustentabilidade é uma das palavras mais presentes na mente do consumidor, tendo-se revelado como uma mega tendência alimentar em 2020. [3]
A alimentação dos portugueses não é ainda considerada sustentável, tendo em conta que somos o país mediterrânico com maior pegada alimentar per capita. No entanto, é notável um aumento do interesse e sensibilização para as questões da sustentabilidade. [4]
Segundo um estudo realizado em quatro países - Portugal, Espanha, França e Hungria, pelo Oney e pela OpinionWay, 85% dos portugueses demonstram-se preocupados com o consumo sustentável. [5]
Segundo o II Grande Inquérito sobre sustentabilidade em Portugal: [6]
- Os produtos de origem animal (como a carne e o peixe) ainda ocupam uma posição central nas refeições dos portugueses, fazendo parte do que entendem como uma refeição culturalmente adequada. Contudo, quando questionados sobre as ações que estão dispostos a tomar em relação aos impactos ambientais destes alimentos, os inquiridos mostram-se globalmente disponíveis para alterar os seus hábitos alimentares:
- - Disposição para a redução do consumo de carne (50,6%) e para seguir uma alimentação mais de base vegetal (45,1%);
- - Disposição para pagar mais por carne proveniente de métodos de produção mais sustentável (46,6%);
- - 65% dos participantes já fazem pelo menos uma refeição (almoço/jantar) sem carne ou peixe durante a semana.
- Os portugueses estão muito preocupados com o impacto dos plásticos na saúde e no ambiente. “Levar sacos ou embalagens de casa quando vou comprar frutas e legumes” é a prática mais comum, no sentido da redução dos plásticos;
- Ao nível da gestão de resíduos, 23% dos inquiridos declara já utilizar restos de comida para compostagem ou alimentação dos animais;
- Os portugueses tendem a apoiar de forma muito expressiva as medidas que lhes foram apresentadas, em particular a redução do desperdício alimentar (acima de 80%).
Segundo o The Green Revolution Portugal: [7]
- Cerca de 9% da população portuguesa adota atualmente uma alimentação com os vegetais como base, existindo a nível nacional cerca de 764 mil adultos veggies - englobando vegetarianos, vegans e flexitarianos (consomem refeições de base vegetal mas também carne e peixe, ocasionalmente), o que vai de encontro com a tendência registada pelo inquérito anteriormente mencionado;
- Nota-se que esta é uma tendência em crescimento, sendo que 19% dos veggies começaram a sê-lo no último ano;
- 45% estão a reduzir ou a eliminar o consumo de carne vermelha e 54% o consumo de enchidos.
Projetos e Iniciativas
Adicionalmente várias iniciativas e projetos têm surgido com a sensibilização para estes temas, contribuindo para a "revolução para a sustentabilidade alimentar", nomeadamente também a nível governamental.
Movimento Unidos Contra o Desperdício
Movimento cívico e nacional, que une a sociedade num combate ativo e positivo ao desperdício alimentar, reforçando a importância de cada um de nós nesta luta.
Este Movimento conta com o Alto Patrocínio do Presidente da República e o apoio institucional do Secretário-Geral da ONU. Tem como grandes objetivos contribuir para facilitar o aproveitamento de excedentes, incentivar e facilitar a doação das sobras, bem como promover um consumo responsável.
Sustentabilizar o Futuro através da Alimentação
A Associação Portuguesa de Nutrição, tem a decorrer, desde 2017, um Programa de Sensibilização e Informação sobre Sustentabilidade Alimentar adaptado à idade escolar, mais especificamente, ao ensino secundário.
Reúne um conjunto de recursos que podem ser utilizados como instrumentos de trabalho em contexto de sala de aula, integrando-os nos conteúdos programáticos das várias disciplinas lecionadas (p.ex.: biologia e geologia, geografia, história, inglês).
Um programa de incentivo a hábitos alimentares saudáveis e sustentáveis na idade escolar, segmentado em várias iniciativas que visam estimular o aumento do consumo de legumes e proteína vegetal nas idades mais jovens.
Projeto que visa a formação em compostagem, a oferta de um compostor doméstico aos munícipes que têm espaço para o instalar e o apoio continuado da câmara municipal de Lisboa aos munícipes que, através de inscrição, manifestem o interesse em reduzir os seus resíduos domésticos, produzindo fertilizante que virá a ser utilizado no seu logradouro, quintal ou jardim.
Não tendo espaço com terra para instalar o compostor, existe ainda a possibilidade da compostagem comunitária. A Câmara Municipal de Lisboa instalou de compostores comunitários piloto em quatro freguesias: Ajuda, Areeiro, Campolide e Olivais.
Fontes:
1 - FAO, WHO. Sustainable Healthy Diets Guiding Principles. Sustainable healthy diets. 2019. http://www.fao.org/3/ca6640en/ca6640en.pdf
2 - Food and Agricultural Organization (FAO) of the United Nations. Food and Agriculture: Key to achieving the 2030 Agenda for Sustainable Development. Food Agric Organ United Nations. 2016. http://www.fao.org/3/a-i5499e.pdf
3 - Trends 2020 - PortugalFoods [Internet]. [cited 2021 Apr 16]. Available from: https://www.portugalfoods.org/noticias/trends-2020/
4 - Galli A, Moreno Pires S, Iha K, Alves AA, Lin D, Mancini MS, et al. Sustainable food transition in Portugal: Assessing the Footprint of dietary choices and gaps in national and local food policies. Sci Total Environ. 2020. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0048969720348361
5 - Sousa B. 85% dos portugueses preocupados com o consumo sustentável. Gd Consum [Internet]. 2020 [cited 2021 Apr 16];4(3):57–71. Available from: https://www.oney.pt/-/media/Files/sala-imprensa/press-release/estudo-consumo-sustentavel.pdf
6 - Truninger M, Schmidt L, Fonseca S, Graça J, Junqueira L. Segundo Grande Inquérito sobre Sustentabilidade Relatório Síntese. 2019. [cited 2021 Apr 16];. Available from: https://observa.ics.ulisboa.pt/wp-content/uploads/2020/04/II-Grande-Inque%CC%81rito-Sustentabilidade-2019-2.pdf
7 - Lantern. The Green Revolution Portugal. Growth Change [Internet]. 2019 [cited 2021 Mar 10];2(3):36–41. Available from: https://www.lantern.es/papers/the-green-revolution-portugal
8 - Unidos Contra o Desperdício | Movimento [Internet]. [cited 2021 Apr 16]. Available from: https://www.unidoscontraodesperdicio.pt/
9 - APN. Programa de Sustentabilidade nas Escolas [Internet]. Associação Portuguesa de Nutrição. 2017 [cited 2021 Apr 16]. Available from: https://sustentabilidadealimentar.apn.org.pt/noticia/lancamento-programa-sustentabilizar-o-futuro-atraves-da-alimentacao
10 - Prato Sustentável – A criar pratos para o futuro [Internet]. [cited 2021 Apr 16]. Available from: https://www.pratosustentavel.pt/
11 - Câmara Municipal de Lisboa - Lisboa a Compostar [Internet]. [cited 2021 Apr 16]. Available from: https://lisboaacompostar.cm-lisboa.pt/pls/OKUL/f?p=178:1:10482821716876