No artigo de hoje voltamos a abordar o tema do desperdício alimentar, desta vez, focando, particularmente, num alimento tão caracteristicamente consumido no nosso país, o pão - o alimento mais desperdiçado em Portugal. 

 

 

Pão - o alimento mais desperdiçado em Portugal

 

 

De facto, e como já foi abordado em artigos anteriores, sabemos que uma alimentação sustentável deve proporcionar a redução do desperdício alimentar, considerando o impacto que este acarreta, para além de consequências ambientais, uma dimensão social e ética, verificando-se que, numa realidade em que muitos passam fome, continuam a desperdiçar-se toneladas de alimentos todos os anos. [1,2]

É inegável o impacto ambiental do desperdício alimentar. Para além de se associar ao desperdício de resuros naturais, que foram  utilizados para produzir alimentos que acabam por não ser consumidos, associa-se também a adicionais emissões de gases com efeitos de estufa. Os alimentos desperdiçados que acabam nos aterros são responsáveis por emissões de metano. Segundo estudos da Agência de Protecção do Ambiente norte-americana, os aterros emitem o equivalente a 20% das centrais energéticas de carvão. [2,3]

  

Desperdício Alimentar em Portugal

O PERDA - Projeto de Estudo e Reflexão sobre o Desperdício Alimentar - estimou que cerca de 17% das partes comestíveis dos alimentos produzidos são perdidos ou desperdiçados, o que representa 1 milhão de toneladas por ano. [4]

Nos países industrializados a maioria dos alimentos são desperdiçados a nível da distribuição e do consumo final e Portugal não é exceção. De facto, é ao nível das famílias, do consumidor final, que o desperdício alimentar se revela mais elevado. Tal facto salienta a necessidade de alteração de comportamentos por parte do consumidor. [4]

 

O Caso do Pão

O pão é um alimento bastante presente na alimentação dos portugueses, o que tem implicações a nível das perdas. Sendo um produto para consumo essencialmente no próprio dia em que é adquirido, leva a que haja mais desperdíio em especial na distribuição e padarias, sendo que este produto não irá ser vendido no dia seguinte à sua produção. Ao nível do consumidor final, que tenderá a não consumir o pão que não esteja fresco, ocorre também muito deste desperdício. [4]

Este destaca-se como um dos alimentos mais desperdiçados, não só em Portugal - onde é o alimento mais desperdiçado, como também em países como o Reino Unido, onde se desperdiçam cera de 20 milhões de fatias todos os dias, ou a Alemenha, onde 19 % da produção acaba no lixo. [4,5,6]

 

 

Bread3

 

 

Como podemos contribuir para reduzir o desperdício de pão? [7,8]

Existem alguns cuidados que devemos ter tanto ao comprar este alimento como para prolongar o tempo de vida útil do mesmo no dia a dia, não esquecendo reaproveitar possíveis sobras que já estejam em final de vida útil. 

 

Na compra

  • Planear. A redução do desperdício alimentar em geral, ao nível das famílias, deve começar com planeamento e organização e isto aplica-se ao pão também. Que quantidade vou comprar para consumo rápido? Vou comprar uma determinada quantidade para congelar? Devemos organizar a compra evitando adquirir quantidades excessivas;
  • Comprar pão por fatiar. Se comprarmos o pão já fatiado, este terá uma maior porção exposta ao ar e não se manterá fresco por tanto tempo. Corta as fatias apenas à medida que fores precisando delas.

 

Conservação 

  • Não guardes o pão ainda quente. Deixa o pão ao ar até que arrefeça completamente antes de guardar. O vapor libertado pelo pão transportado em especial nos sacos de plástico de supermercado forma o ambiente ideal para o desenvolvimento de fungos;
  • Não guardar em sacos de plástico fechados. Mesmo quando o pão já tiver arrefecido, deves evitar guardá-lo em sacos de plástico, que criam um ambiente propício ao desenvolvimento de bolor. Em vez disso, opta por opções como caixas ou sacos para pão reutilizáveis que são geralmente feitos com materiais respiráveis que conservam melhor este aimento, sendo também materiais mais sustentáveis; 
  • Não guardes o pão no frigorífico. As temperaturas entre o congelamento e a temperatura ambiente, ou seja, a refrigeração, fazem com que o pão se estrague mais rápido.  Uma experiência demonstrou que um determinado pão, que quando armazanado à temperatura ambiente durava 6 dias, quando no frigorífico apenas mantinha as suas características por 1 dia.  
  • Armazena o pão à temperatura ambiente num local seco. Isto significa que deves evitar colocá-lo perto de máquinas ou, por exemplo, por cima do frigorífico, uma vez que fica sujeito a variações de temperatura e temperaturas mais elevadas;
  • Congela o que sabes que não vais consumir de imediato. Congelar pode ser uma ótima solução para conservar o pão por mais tempo, mantendo relativamente as suas características (desde que descongelado devidamente, evitando, por exemplo, reaquecê-lo no microondas por mais que uns segundos). 

 

Aproveitamento

  • Torradas e reaquecimento no forno. As típicas torradas podem funcionar tão bem como reaquecer o pão no forno a mais de 60ºC - temperatura de gelificação do amido do trigo - o que poderá ser mais útil para maiores quantidades e que permite de igual forma que o pão recupere em parte as suas características. 
  • Migas e açorda. O pão já com alguns dias pode ser reaproveitado em confeções como as migas e a açorda para as quais não há necessidade de usar pão fresco.
  • Pão ralado. Uma outra alternativa para o reaproveitamento do pão em final de vida, poderá ser fazer pão ralado caseiro. Para tal podemos tostar o pão - por exemplo no forno, a 180ºC - e depois triturá-lo e reservar num recipiente fechado.

 

 

Pão - o alimento mais desperdiçado em Portugal 

 

 

Iniciativas que se destacam

 

 Auchan - Pão para culinária de Desperdício Zero: Com o objetivo de reduzir o desperdício alimentar, a Auchan passou a vender, em 2019, o pão do dia anterior. Este pode ser utilizado para culinária e está bem identificado em loja, e a um preço mais acessível, sendo que o valor é cerca de 50% inferior ao habitual do pão. Também os pães com mais de dois dias são transformados em pão ralado.

 

Toast Ale: Marca que usa excedentes de pão para substituir a cevada virgem na produção de cerveja, usando portanto menos terra, água e energia e evitamos as emissões de carbono associadas ao desperdício deste alimento.

 

Bread Beer: Uma cerveja artesanal desenvolvida em conjunto com a Vadia, produzida com restos de pão e migalhas das padarias Continente.

 

 

 

Fontes:

1 - Ishangulyyev R, Kim S, Lee SH. Understanding food loss and waste-why are we losing and wasting food? Foods [Internet]. 2019 [cited 2021 Feb 4];8(8). Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6723314/

2 - Food and Agricultural Organization (FAO) of the United Nations.. Global Food losses and Food waste. Food Agric Organ United Nations [Internet]. 2011 [cited 2021 Feb 4];(May):1. Available from: http://www.fao.org/3/mb060e/mb060e00.htm

3 - US EPA . Municipal solid waste generation, recycling, and disposal in the United States: facts and figures for 2010. Washington, DC, USA: United States Environmental Protection Agency. 2011.  Available from:https://archive.epa.gov/epawaste/nonhaz/municipal/web/pdf/msw2010factsheet.pdf

4 - Baptista, Pedro, Campos, Inês, Pires, Iva, Vaz, Sofia G. Do Campo ao Garfo. Desperdício Alimentar em Portugal. 2012. Available from:https://www.cncda.gov.pt/images/DocumentosLegislacao/EstudoseRelat%C3%B3rios/PERDAdocampoaogarfo.pdf 

5 - Food surplus and waste in the UK – key facts | WRAP [Internet]. [cited 2021 May 7]. Available from: https://wrap.org.uk/resources/report/food-surplus-and-waste-uk-key-facts

6 - Unser täglich Brot [Internet]. [cited 2021 May 7]. Available from: https://www.wwf.de/2018/oktober/unser-taeglich-brot/

7 - Harold McGee. On Food and Cooking. 2004. [cited 2021 Mar 12]. Available from: https://sites.google.com/a/libeho-namobu.web.app/womorillobooks/-get-harold-mcgee-s-book-on-food-and-cooking-the-science-and-lore-of-the-kitchen

8 - Stear CA. Dough and Bread Preservation. In: Handbook of Breadmaking Technology [Internet]. Springer US; 1990 [cited 2021 May 7]. p. 679–714. Available from: https://link.springer.com/chapter/10.1007/978-1-4615-2375-8_20