Após a realização do webinar "O Futuro do Granel" - realizado no passado dia 17 de julho, evento dedicado, como o título indica, ao tema do granel, e que contou com a presença de oradores nacionais e internacionais, iniciativa da Maria Granel com o propósito de refletir sobre vários aspeto associados ao setor, nomeadamente o seu impacto e papel no sentido de um consumo mais consciente, - apresentamos hoje uma perspetiva do granel sobre a ótica da nutrição.
Um passo para a sustentabilidade
Redução das embalagens de uso único
As cadeias de abastecimento alimentar implicam, de diversas formas, uma pressão a nível ambiental, contribuindo nomeadamente para as alterações climáticas. Associado a estes efeitos negativos, para além da poluição devida ao transporte, desperdício alimentar, entre outros, encontra-se o gasto de embalagens de uso único. [1]
De facto, de acordo com o Eurostat, em 2016, na União Europeia, gerou-se, por habitante, cerca de 170 kg de lixo derivado de embalagens, sendo a maior parte deste papel e cartão seguido de plástico e vidro. [2]
A venda de produtos a granel pode, neste sentido, constituir um veículo para uma forma de consumo mais sustentável, permitindo a redução das embalagens de uso único. A venda a granel em lojas com conceito "zero waste", como é o caso da Maria Granel, no qual se promove a venda sem embalagens não reutilizáveis, pode ser particularmente vantajosa - considerando que por vezes a venda a granel, ainda que reduzindo a utilização de embalagens de uma forma geral, pode implicar o uso de itens como sacos de plástico ou papel.
Resumidamente, o termo "zero waste" é definido pela Zero Waste Internacional Alliance como a conservação de todos os recursos por meio de produção e consumo responsáveis, recuperação e reutilização de produtos, embalagens e materiais. [3] Assim, num sistema zero waste, o fluxo de materiais é circular, não havendo desperdício dos mesmos. [4]
Redução do desperdício alimentar
A compra a granel tem também o potencial de contribuir para a redução do desperdício alimentar, uma vez que temos a possibilidade de adquirir apenas as quantidades de alimentos de que realmente precisamos. Ademais, tendencionalmente, este tipo modo de compra incentiva a um consumo mais consciente.
De facto, a APA - Agência Portuguesa do Ambiente, sugere a compra apenas das quantidades necessárias, “uma vez que segundo European Week For Waste Reduction cada família descarta 10% dos produtos alimentares adquiridos e que, muito frequentemente, esses produtos não chegam a ser desembalados”. Desta forma, adquirir quantidades de alimentos corretamente adaptadas às necessidades de consumo permite reduzir o desperdício alimentar, a produção de resíduos e a despesa com os produtos que se estragam e não chegam a ser utilizados. [5,6]
Que tipo de alimentos encontramos a granel?
Podemos comprar a granel diversos tipos de alimetos, tipicamente inseridos dentro do género de produtos de mercearia seca, entre os quais:
- Cereias e pseudocereais
- Leguminosas (feijão, grão, lentilhas...)
- Frutos secos/oleaginosos (amendoins, amêndoas, nozes, cajus...)
- Frutas e vegetais desidratados
- Farinhas
- Bolachas e chocolates
- Entre outros
Também as frutas e vegetais, mesmo adquiridas em supermercados, são muitas vezes compradas a granel sem que pensemos no assunto. Neste caso, podemos fazer a diferença recusando a utilização dos característicos sacos descartáveis, levando sacos reutilizáveis em alternativa ou mesmo não utilizando saco nos casos em que seja possível (ex: uma courgette ou um cacho de bananas).
Vantagens do ponto de vista nutricional
No geral, o tipo de alimentos característicamente vendidos a granel (com algumas exceções como doces, gomas, bolachas e frutos secos salgados) podem ser integrados como parte de uma alimentação diária saudável, incluindo-se alimentos como, por exemplo:
- Leguminosas, recomendando-se o seu consumo frequentemente numa alimentação de padrão mediterrânico [7], sendo uma fonte de proteína de origem vegetal, vitaminas do complexo B, entre outros; [8]
- Frutos Secos/Oleaginosos, recomendando-se o consumo de 1-2 porções diárias (máximo 30g) [7] e sendo uma fonte de fibra, "gorduras saudáveis", minerais, antioxidantes, etc. [9]
A aquisição destes alimentos a granel, segundo a DECO, poderá ser mais barata quando em comparação com os seus equivalentes pré-embalados, [6] o que será também uma vantagem, podendo facilitar o acesso a alimentos de elevada qualidade nutricional.
Cuidados com a conservação [10,11]
Após a compra dos alimentos, devem ser tidos alguns cuidados com a conservação em casa, nomeadamente:
- Ainda na loja, apontar os prazo de validade dos alimentos adquiridos. Dica: regista os prazos nos próprios recipientes onde pretenderes acondicionar os alimentos, o que irá também ajudar na gestão da alimentação em casa e contribuir para evitar o desperdício;
- Acondicionar os alimentos em recipientes hermeticamente fechados e devidamente higienizados;
- Optar por recipientes transparentes para que reconhecer facilmente o seu conteúdo, por exemplo de vidro, sendo um dos melhores materiais para este fim;
- Armazenar os recipientes num local fresco e seco.
Em que casos não se deve comprar a granel?
Ainda que a segurança alimentar dos produtos a granel seja assegurada, sendo necessário neste tipo de comércio a implementação e cumprimento das normas de HACCP - Análise de Perigos e Controlo de Pontos Críticos, o consumo dos mesmo não será adequado em algumas condições de saúde, como é o caso da doença celíaca [13] ou algum tipo de alergia grave a alimentos que possam estar presentes.
Isto acontece pois, mesmo não estando a consumir diretamente os alimentos de risco, que no caso dos doentes celíacos seriam alimentos com glúten, como uma farinha de trigo, há um elevado risco de ocorrer contaminação cruzado, não estando os alimentos embalados, o que poderá provocar uma reação.
Onde comprar a granel?
Atualmente, existem já diversas lojas a vender a granel nos vários distritos do país. No site agranel.pt, criado por Catherine Francisco, é possível localizar muitas delas, sendo disponíbilizado um mapa interativo que facilita a sua identificação. Funciona assim como um directório para lojas que vendem a granel e, para o qual podemos contribuir adicionando novas lojas que não estejam já identificadas.
Alguns supermercados também disponibilizam a opção de compra de determinados produtos a granel - para além dos frescos (frutas e legumes). Também pode ser uma opção para contribuir para a redução das embalagens, desde que não se opte por utilizar os sacos de plástico disponibilizados para este fim.
Dicas para as compras a granel
- Leva contigo sacos reutilizáveis, tanto para o transporte das compras como de alguns dos alimentos em específico;
- Em alguns casos, como cereais ou leguminosas, poderá fazer sentido levar frascos para o transporte dos alimentos;
- Caso optes por levar frascos, para facilitar, podes apontar o peso dos mesmos no próprio frasco por exemplo;
- Não te esqueças de apontar as validades! Utiliza o telemóvel ou leva contigo uma caneta/lápis.
Fontes:
1 - Molina-Besch K, Wikström F, Williams H. The environmental impact of packaging in food supply chains—does life cycle assessment of food provide the full picture? Int J Life Cycle Assess. 2019 Jan 28;24(1):37–50.
2 - Packaging waste statistics - Statistics Explained [Internet]. [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://ec.europa.eu/eurostat/statistics-explained/index.php?title=Packaging_waste_statistics
3 - Zero Waste Definition – Zero Waste International Alliance [Internet]. [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://zwia.org/zero-waste-definition/
4 - Song Q, Li J, Zeng X. Minimizing the increasing solid waste through zero waste strategy. J Clean Prod. 2015 Oct 1;104:199–210
5 - Prevenção de Resíduos | Agência Portuguesa do Ambiente [Internet]. [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://www.apambiente.pt/residuos/prevencao-de-residuos
6 - Ribeiro DF. Avaliação da venda de produtos a granel em supermercados – Caso de estudo Supermercado Pingo Doce [Internet]. 2018 [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://run.unl.pt/handle/10362/59604
7 - Barbosa C, Pimenta P, Real H. Roda da Alimentação Mediterrânica e Pirâmide da Dieta Mediterrânica: comparação entre os dois guias alimentares. Acta Port Nutr [Internet]. 2017 [cited 2021 Mar 26];11:6–14. Available from: https://actaportuguesadenutricao.pt/edicoes/roda-da-alimentacao-mediterranica-e-piramide-da-dieta-mediterranica-comparacao-entre-os-dois-guias-alimentares/
8 - Mudryj AN, Yu N, Aukema HM. Nutritional and health benefits of pulses [Internet]. Vol. 39, Applied Physiology, Nutrition and Metabolism. Canadian Science Publishing; 2014 [cited 2021 Jan 20]. p. 1197–204. Available from: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25061763/
9 - Ros E. Health Benefits of Nut Consumption. Nutrients [Internet]. 2010 [cited 2021 Mar 26];2:652–82. Available from: www.mdpi.com/journal/nutrients
10 - USDA. Shelf-Stable Food Safety | Food Safety and Inspection Service [Internet]. [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://www.fsis.usda.gov/food-safety/safe-food-handling-and-preparation/food-safety-basics/shelf-stable-food
11 - Safe Food Storage | Nutrition.gov [Internet]. [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://www.nutrition.gov/topics/food-safety/safe-food-storage
12 - Beitzen-Heineke EF, Balta-Ozkan N, Reefke H. The prospects of zero-packaging grocery stores to improve the social and environmental impacts of the food supply chain. J Clean Prod. 2017 Jan 1;140:1528–41.
13 - Dicas 4 - Associação Portuguesa de Celíacos [Internet]. [cited 2021 Aug 18]. Available from: https://www.celiacos.org.pt/dicas-4/