Com a aproximação do Carnaval, uma das festividades populares mais animadas do nosso calendário, lembramo-nos de toda a cor e exuberância das máscaras e fantasias.
Embora as festividades ligadas à data estejam suspensas, esta data é um bom pretexto para uma reflexão em torno dos impactos causados pela indústria têxtil e para conhecermos a “Share2use”, uma iniciativa portuguesa que pretende mitigar este problema.
Ao comprarmos uma peça de roupa, levamos para a casa muito mais do que um pedaço de tecido. Vestimos as histórias que estão por trás da produção daquele item. Quem a confeccionou? Será que os envolvidos na cadeia produtiva tinham condições dignas de trabalho? A marca escolhida respeitou os recursos naturais e humanos? A peça viajou muito até chegar às nossas mãos?
Impactos da indústria
Os impactos causados pela indústria têxtil não se restringem apenas ao descarte das peças. Passam pela extração das matérias-primas, pela confeção, os transportes utilizados, o uso das peças e, finalmente, o descarte. Ou seja, toda a cadeia produtiva (convencional) compromete, em algum grau, os recursos naturais e, por vezes, os sociais.
Foto: UniPlanet
O que nos dizem os números?
A produção de algodão, por exemplo, que é a principal matéria-prima da produção têxtil mundial, consome 24% do mercado global de inseticidas e 11% das vendas de pesticidas, segundo um estudo da WWF.
Segundo dados da Agência Portuguesa do Ambiente, citados pela associação Zero Desperdício, em 2017, foram recolhidas cerca de 200.756 toneladas de têxteis nos resíduos urbanos, o que representa cerca de 4% do total de resíduos produzidos em Portugal.
Os números ainda estão longe de serem animadores, segundo Carmen Lima, da associação ambientalista Quercus, apenas 1% dos resíduos têxteis produzidos no país são encaminhados para a reciclagem.
No âmbito social, os impactos continuam. De acordo com um estudo da Agência Internacional de Pesquisa do Cancro (IARC), os trabalhadores da indústria de curtume de couro, expostos a uma ampla gama de produtos químicos, têm um risco aumentado de cancro, entre 20 e 50%. Fora isso, há ainda uma desumana realidade nas linhas de produção, mundo afora.
Dos desafios à oportunidades
Face aos impactos causados pela indústria têxtil nacional, a Associação Zero Desperdício, que trabalha com entidades que doam excedentes alimentares, desenvolveu o “Share2Use”, um projecto cofinanciado pelo Fundo Ambiental, que pretende combater o desperdício têxtil em Portugal.
Esta plataforma colaborativa foi lançada em dezembro de 2020 e passará por uma fase de implementação em formato de projeto piloto com parceiros estratégicos. Visa assegurar a comunicação e partilha de excedentes têxteis, entre doadores e beneficiários reduzindo o desperdício e aumentando o ciclo de vida das peças de vestuário e/ou têxtil lar, através da revalorização, isto é reutilização, recuperação ou reciclagem, de acordo com os princípios da economia circular. “Esta ação de comunicação vem reforçar a necessidade de apresentar junto das organizações e consumidores informação prática sobre o desperdício têxtil e a necessidade de implementar políticas e ações que promovam a circularidade”, diz Paula Policarpo, presidente da Zero Desperdício e coordenadora do projeto “Share2Use”.
Webinar promovido pela Associação Zero Desperdício
Iniciativas como esta são fundamentais para que se possa minimizar a pegada ecológica deste tipo de indústria. É um caminho longo que implica o envolvimento de todos: instituições, empresas, governo e sociedade civil. Enquanto consumidores, estarmos mais informados é meio caminho para fazermos melhores escolhas - mais responsáveis e mais conscientes.
Fontes: Associação Zero Desperdício, WWF, e Agência Internacional de Pesquisa do Cancro.