Hoje ampliamos a voz de um projeto que está a incentivar mudanças de hábitos e atitudes em Portugal de forma divertida e positiva. Há três anos, o The Trash Traveler (O Viajante do Lixo) dedica-se à sensibilização para o problema da poluição marinha provocada pelo plástico. Por onde o projeto passa, de norte a sul, estimula a reflexão e a transformAção.
Imagem: Arquivo pessoal - Andreas Noa
ComUnidade: Projeto The Trash Traveler (O Viajante do Lixo)
Fundador do projeto The Trash Traveler, Andreas Noe é um ambientalista alemão que se apaixonou pelo nosso país e que dedica a sua vida a desenvolver atividades que envolvem a recolha de resíduos plásticos nas praias, beatas nas cidades, e não só. Todas as suas ações têm uma banda sonora, canções produzidas pelo próprio e que retratam os principais desafios. “Eu vinha sempre para Portugal nas férias. E em 2017 decidi vir viver aqui mais tempo. Em Lisboa, trabalhei num laboratório - sou biólogo molecular - e depois num consultório médico”, conta Andreas.
Sempre que tinha uma pausa no trabalho, Andreas aproveitava para surfar e estar em contacto com a natureza. E veio dela, inclusive, a inspiração para uma transformação de vida. "Basicamente todos os dias eu era confrontado com a quantidade chocante de plástico nas praias e no oceano. Decidi despedir-me em 2019 e comecei a recolher todo o lixo que eu conseguia”. Nascia ali o projeto The Trash Traveler.
Eram apenas os primeiros passos do projeto e da nova vida de Andreas, já que nessa altura também adotou o minimalismo, vivendo numa carrinha, sem eletricidade e sem água canalizada, percebendo que precisava de muito pouco para ser realmente feliz. “Sempre tive o projeto de ser minimalista, de pensar no meu consumo, aquilo de que realmente preciso. Quando fui viver para a minha carrinha, no início, pensei que sentiria falta da eletricidade e da água. No entanto, apercebi-me de que talvez fosse também possível viver com uma lata de cinco litros de água para ter quase dois duches”, comenta Andreas.
Primeira paragem - The Plastic Hike (A Caminhada do Plástico)
Em 2020, The Trash Traveler tornou-se um projeto comunitário, acreditando que a consciencialização é mais eficaz quando desenvolvida a várias mãos e a várias vozes. Com o apoio de algumas associações, grupos e ONGs, a iniciativa chegou a centenas de pessoas, graças a uma abordagem divertida, que transmite esperança e otimismo.
Com o seu Ukulele e as suas músicas, Andreas percorreu toda a costa de Portugal continental, acompanhado por mais de 100 ONGs e 560 pessoas. Ao longo dos 58 dias e 1152 km trilhados, recolheram mais de duas toneladas de lixo nas praias, despertando consciências e inspirando a transformAção. “Nunca se tratou de limpeza, embora ela tenha sido feita, é uma questão muito profunda o que estamos a ver e o que a praia está basicamente a reflecir. É um espelho dos nossos hábitos de consumo e do nosso sistema”, sublinha ele.
Da primeira iniciativa do projeto resultou uma exposição de arte plástica e um documentário de sensibilização sobre a comunidade em Portugal.
Imagens: Arquivo pessoal
Segunda paragem - The Butt Hike (A Caminhada das Beatas)
No ano seguinte, em 2021, o projeto comunitário saiu para uma nova jornada, desta vez para mostrar onde começa o oceano: Longe da praia, nas nossas cidades e em nós. "Esta rede e a quantidade de pessoas que se preocupam em Portugal fizeram-me ficar. Por isso, decidi criar uma grande aventura todos os anos, sendo que a deste ano ficou conhecida como The Butt Hike".
Em dois meses, a iniciativa recolheu 1.1 milhões de beatas de cigarro em Portugal. Estiveram envolvidas 600 pessoas e 70 ONGs. “As pontas do cigarro são o item de plástico mais sujo do mundo e estão cheias de toxinas. São atiradas ao chão uma média de 7 mil beatas por minuto em Portugal. Ou seja, são precisos dois meses de limpeza para compensar duas horas e meia a atirar beatas para o chão.”, explica.
Andreas insiste em defender que o seu projeto não é sobre limpeza, trata-se de um alerta sobre um problema que se agrava anualmente. “O projeto não é sobre limpeza mas sobre abrir os olhos e mudarmos a nossa mentalidade, isto porque, no início, as pessoas agradeceram-me por limpar a praia. No entanto, não é possível limpar a praia, nem as cidades, nem a natureza se o nosso sistema continuar a ser um sistema de utilização único. Cerca de oito milhões de toneladas de lixo vão parar ao oceano. Se compararmos isso com as 1,6 toneladas de lixo que recolhemos durante a caminhada, percebemos que não é nada. Precisamos trabalhar na origem dos problemas e para isso é importante aumentar a sensibilização e, consequentemente, a pressão, sobre as empresas e Governos para que eles mudem o sistema”.
Imagens: Arquivo pessoal
Soluções ancoradas na economia circular são fundamentais para minimizar a quantidade de lixo e, portanto, as beatas recolhidas na segunda ação do projeto foram recicladas de forma a darem origem a cogumelos e o produto final poderá ser usado, futuramente, para construir uma sede para outros eventos de consciencialização.
Desta aventura resultou também um documentário que será exibido no próximo verão nalgumas praias do país.
Terceira paragem - The Trash Cycle: A aventura de 2022
A aventura prevista para 2022 é a The Trash Cycle (O Ciclo do Lixo) onde Andreas e a sua equipa restaurarão uma bicicleta antiga e danificada que servirá de veículo para colocarem novamente os pés (e os corações) na estrada.
A partir de 19 de abril até meados de Junho, Andreas irá pedalar cerca de 3 mil km de norte a sul do país. Durante os dois meses, o projeto voltará sensibilizar a comunidade sobre a poluição causada pelo lixo. “Esta aventura contará com ações de limpeza diárias em conjunto com escolas, ONGs, municípios e o público em geral, para que todos juntos possamos cuidar do planeta”, antecipa.
Itinerário previsto para a Trash Cycle
O Trash Cycle reforçará também a necessidade da implantação de um sistema de depósito para bebidas e embalagens take away em Portugal. “Pretendemos que todas as garrafas, latas e embalagens de take away recolhidas durante as limpezas sejam utilizadas para um evento final para demonstrar a quantidade de lixo que poderia ser salva por um sistema de depósito”.
Além da sensibilização e reflexão gerada “face to face” durante a viagem, a equipa pretende apoiar e disseminar a petição desenvolvida por várias ONGs e iniciativas para a criação de um sistema de depósito em Portugal: “Há mar e mar há usar e recuperar”.
O a granel embarcará no The Trash Cycle
Uma das novidades que nos encheu de orgulho e esperança é saber que um dos membros da equipa será responsável por localizar mercados locais e lojas a granel, para que toda a comida seja comprada e consumida sem embalagens. “Com esse desafio pretendemos demonstrar que é possível consumir sem provocar lixo desnecessário”. finaliza Andreas.
Andreas com a nossa Eunice, numa das suas visitas à loja de Campo de Ourique
Se procuras um programa para o verão, fica atento às datas, é provável que o Trash Traveller esteja bem perto de si.
Até já!